Simplicidade e Musicalidade (Por Roberto Nascibem)


Batemos um papo com o incansável guitarrista Carlos Coelho, do Biquíni Cavadão. Em 2018, eles completam 33 anos de carreira, com uma bagagem que inclui 18 discos, 3 dvd´s, shows no Brasil e no exterior. 

 

Quais suas influências na guitarra? Você estudou formalmente?

As minhas influências são basicamente as mesmas a vida inteira.  Ao longo da vida você é influenciado de formas diferentes, por exemplo, eu fui muito influenciado pelos Beatles.  Na medida em que você vai evoluindo como músico, você vai se aprimorando, se transformando, você consegue ouvir as mesmas músicas e elas trazem informações novas.

Aos 12 anos, no Rio de Janeiro, eu estudei violão com uma professora mas queria alguém que me ensinasse Beatles.  Acabei estudando violão clássico com Antonio Gomes, não era exatamente o que eu queria mas a técnica acabou me ajudando bastante até que acabei encontrando um professor de guitarra chamado Isidoro, recém chegado da Berklee e que me ensinou bastante harmonia.

Como é seu processo de criação? Se reúnem para Jam´s?  Sei que você anota bastante coisas…

O meu processo de criação varia muito, às vezes eu começo pela letra, às vezes começo pela música ou por um riff de guitarra e eu gosto muito de parceiros, gosto muito de chamar pessoas para acabar a música comigo porque eu gosto de outra visão, acho instigante ela chegar com uma frase que você não espera e isso pode levar a música pra um lugar onde você não levaria sozinho.

Eu acho também que com tempo o compositor se esgota um pouco. Ele pode até continuar compondo bem, mas ele passa a compor de uma mesma maneira.  Você pode ser o maior compositor do mundo, um Paul McCartney, sem inevitavelmente se repetir ou fazer músicas lindíssimas que vão ser comparadas com as que fez anteriormente.  É muito difícil um cara se renovar, então eu gosto de ter novos parceiros, você vai sempre instigando um ao outro com informações novas que está trazendo.

E quando eu estou fazendo arranjo eu geralmente boto a música e fico tocando por horas, e é como se eu ouvisse na minha cabeça uma linha e só tivesse que tocar aquilo, sabe!? As idéias vêm na cabeça antes de chegar aos dedos.

No Biquíni Cavadão a gente já trabalhou das mais variadas formas.  Já trabalhamos com todos dentro do estúdio fazendo arranjo pra música, já trabalhamos de formas individuais, ou só baixo e bateria e a guitarra depois, e já fizemos músicas em que a gente praticamente não tocou junto no estúdio, gravava bateria, depois baixo, guitarra em dias diferentes, depois teclados, mais guitarras, voz, mixava.  Eu acho que a melhor forma é todo mundo dentro do estúdio, tocando, daí já grava, ouve, edita, grava de novo, altera tom, bpm, etc. Acho essa praticidade fantástica para trabalhar.

Na banda temos 3 compositores: Eu, Bruno (vocalista) e o Álvaro Birita (baterista).  O Miguel (tecladista) faz mais a parte de música, não escreve letras. Se você comparar, tem épocas em que foi mais o Bruno que compôs, mais o Birita, e tem épocas que fui mais eu.  Se você olhar ao longo da carreira, deve ter um equilíbrio entre os 3 compositores.  A gente resolveu assinar todo mundo junto as composições quando estava começando a carreira por orientação do nosso produtor musical.  Ele dizia que a gente ia discutir muito menos, brigar muito menos por querer ter as músicas no disco porque isso envolve você ganhar mais direito autoral do que os outros quando é autor da música sozinho.

O Projeto ´80´ ( 1 e 2) trás a regravação de inúmeros hits dessa mesma década.Como foi re-arranjar essas músicas, alterar solos/riffs, sem deixar que as canções perdessem a essência original?

Eu acho uma certa ousadia e pretensão o que a gente fez nesses dois discos.  Fizemos isso novamente no novo trabalho (um álbum-tributo ao Herbert Viana, chamado Ilustre Guerreiro, que deverá sair em 2019).  É ousado e ao mesmo tempo arriscado porque você está mexendo em coisas consagradas.

Eu acho que as coisas mais fundamentais a gente procurou manter, às vezes uma parte de guitarra foi pro piano, colocava um riff onde ainda não tinha.  Também acho sagrado letra e melodia, não dá pra mexer.

 

Nota: Foi Herbert Viana que sugeriu o nome ´Biquíni Cavadão´, e também tocou guitarra no primeiro hit. (´Tédio´, de 1985).

 

A tecnologia eliminou de vez o uso de amplificadores no palco?  Side fill´se monitores  deram espaço para os sistemas ear-in. Você curte simuladores de gabinetes, de efeitos e afins?

Nós passamos por todas as fases na carreira.  A gente passou de fita analógica pra gravação digital, você tinha 24 canais que passou pra 48  e que passou pra um número infinito com o computador.  Isso aí faz uma mudança muito grande na sua maneira de tocar, faz você naturalmente tocar pior porque você tem muito mais recursos pra consertar seus erros, então você faz uma vez e fala ´beleza, vamos arrumar aí´! Isso faz com que a banda não tenha necessidade de estar tocando muito bem, o que influencia negativamente.  Uma banda bem ensaiada é melhor que uma banda bem editada. No caso de uma música muito eletrônica não tem banda ensaiada, funciona de outra forma.  Mas dá pra você, trabalhando bem, tocando bem, usufruir de milhões de vantagens do computador.  A vantagem do analógico é que você tem que ter uma banda tocando bem, juntos.

A gente também teve uma grande evolução no show business, que cresceu muito no Brasil ao longo da nossa carreira.  Passamos de monitores no chão pra monitores no ouvido, de amplificadores valvulados para amplificadores digitais e a gente se adapta bem, isso só vem pra ajudar. Você tocar com monitor de ouvido é meio chato porque você não sente o calor da platéia, você não tem uma noção ´espacial´ correta, você vai se aproximando do baixista e você não está ouvindo ele mais alto, acho que isso não é ideal, não é perfeito.  Mas eu prefiro sempre ter um show nota 8 de qualidade do som da minha guitarra e do que estou ouvindo do que um show nota 10 com um amplificador maravilhoso no palco, microfones de captação e P.A. maravilhosos e no show seguinte você pega um som ruim, ampli ruim, etc…Prefiro ficar na média e ter um show com um padrão de qualidade tanto pro público quanto pra mim.

E outra coisa que a gente passou com a era digital: você estava vendendo LP, depois passa a vender CD, depois tem a pirataria onde ninguém compra mais nada e agora a música está voltando a ser comercializada de uma determinada forma, isso é muito importante pra todos os que trabalham com música.  Você também tem acesso às músicas do mundo todo, as pessoas não se interessam mais por álbuns completos, não tem mais sentidos elas estarem juntas num disco. Porque não se lança uma música e depois outra e outra?

Qual seu setup atualmente para os shows?

Eu uso amplificadores Line 6 digitais.  É o HD147 e só.  A guitarra é ligada nele, que tem um controlador.  É muito bom, tem vários amplificadores mas eu acabo usando um ou dois.  Eu uso basicamente um som pra solo, um som pra uma base com pouca distorção e um som limpo. Aí eu vou variando isso botando trêmolos, chorus. Basicamente é o mesmo reverb o show inteiro e eu altero muito os delays, na hora dos solos entram uns mais altos.

De guitarra eu tenho usado uma Telecaster (Fender) e uma Les Paul (Gibson).  A 335 (Gibson) eu aposentei provisoriamente, logo ela estará na ativa novamente. Também uso violões Takamine.

 

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                              Gibson Les Paul e Fender Telecaster, respectivamente

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O Takamine em ação!

    À propósito, a 335 tem um autógrafo do Jimmy Page.  Pode nos contar essa história?

Em 1994, Robert Plant e Jimmy Page vieram para o Brasil lançar o álbum NO QUARTERUNLEDDED pela Polygran e eu tinha alguns conhecidos por lá e consegui participar da entrevista coletiva.  Só foram a quatro cidades no mundo, era Rio, Tóquio e as outras duas eu não me recordo.  Eu tive o privilégio de assistir a entrevista, depois me aproximei, tinha levado duas guitarras pra ele assinar.  Eu estava embasbacado, porque ele é o meu maior ídolo, acho ele o maior guitarrista de todos os tempos, como compositor e arranjador

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Gibson 335. Detalhe para o autógrafo de Jimmy Page, logo abaixo do braço direito do guitarrista.

    Como está sendo trabalhar com o Liminha nesse novo projeto?

Esse é o segundo disco produzido pelo Liminha.  Ele tinha produzido a gente em 2016 (no álbum ´As voltas que o mundo dá´) e agora está produzindo o tributo ao Herbert Viana que vai se chamar Ilustre Guerreiro (tradução germânica para o nome Herbert).  A gente fez uma homenagem a ele, acho que é unânime na banda, todos gostam dos Paralamas. Ele é um excelente compositor e um embaixador do rock, ele fez uma aproximação do rock com a MPB compondo com Gilberto Gil, depois cantando com Djavan, aproximou o rock da música baiana tendo parcerias com Carlinhos Brown e tendo Ivete Sangalo e Daniela Mercury interpretando suas músicas. Ele trouxe a Plebe Rude para a EMI, ele tocava Legião Urbana, Ultraje à Rigor nos shows, músicas que ninguém conhecia ainda. Então ele tem um papel enorme no começo do rock da década de 80.

Falamos com o Liminha, explicamos o projeto e ele é um cara de uma sabedoria musical incrível.  Ele é um produtor que acumula função, ele entende muito da parte técnica, mesa de som, timbrar instrumentos, timbrar guitarra no amplificador, toca maravilhosamente bem guitarra, baixo, toca violão, se comunica bem com o tecladista, com o baterista e é uma pessoa agradabilíssima porque ele faz um clima bom no estúdio, o ´Nas Nuvens´ (estúdio do Liminha no Rio de Janeiro)é um lugar ótimo.

biquini#5               É uma experiência ótima, ele tocou baixo nesse disco e no anterior também, gravou guitarras adicionais, violões, ele contribui demais, ele pega uma ideia sua e toca a mesma coisa que você estava tocando e muda a região, muda o som, fica ali meia hora timbrando uma guitarra, aí você acaba e ele fala ´vamos dobrar a guitarra uma oitava acima, uma quarta acima, agora bota uma oitava abaixo´ e por aí vai, quando você vê aquela sua ideia que já era legal se transformou numa coisa muito mais bacana que você não imaginava.  É muito prazeroso trabalhar com ele, aprende-se muito.

 

 

Carlos Coelho usa violões Takamine, cordas Giannini, correias Pipeline Straps, sistema de energia Pentacústica, palhetas Massah Custom, cabos fornecidos por Cirilo Cabos, suporte para instrumentos Support V&M e cases Nova Case.

Tem apoio da Sonotec, fones Edifier, TeclaCenter, LAND Professional Audio e Quanta Music.