Sons do Harlem (por Rafael Ferraz)


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O Guitarrista André Martins conta tudo sobre o seu novo trabalho solo intitulado “Harlem”

Como nasceu o Harlem?

– O Harlem nasce em 2010 na casa do Paulo Assis. Eu já tinha umas ideais musicais, mas não tinha nenhuma composição, e eu falei com ele mais ou menos na metade de 2010, ele surgiu com a vontade dele de montar o estúdio, e eu queria chamar o Paulo pra gravar, não sabia onde gravar, mas queria que fosse o Paulo Assis que gravasse. Aí ele topou e falou “se você esperar um pouco eu vou montar o estúdio, e a gente faz o primeiro trabalho lá”, e aí casou o nascimento do estúdio com o terceiro disco. Em 2010 eu já tinha umas ideias, eu já queria fazer o terceiro disco, e queria compor de forma diferente por que o Argila demorou muito, e tinham musicas novas e antigas sendo misturadas, e o Infinito foi muito rápido, ganhamos um prêmio, em dois meses a gente compôs todas as faixas, e mais dois ou três meses a gente gravou, mixou e lançou. O Harlem eu queria que fosse um processo, então eu falei “Eu quero começar a fazer o disco, vâmo fazer junto Paulo?”, por que eu queria que ele participasse dessa concepção sonora. Eu não queria começar a compor, gravar fita em casa, gravar demo no computador, por que aí a coisa já vai tomando uma forma mais ou menos, perde um pouco a espontaneidade da criação. E foi o que aconteceu. A gente começou a gravar o Harlem mesmo em 2011. Foi da metade de 2011 a metade de 2013, entre gravação e finalização. E eu não fiz muita coisa em termos de composição, fui buscando só melodias, algumas coisas, mas eu me forcei a não compor no sentido de terminar a musica muito arranjada já pra chegar no estúdio. Foi um processo bem “dentro do estúdio” com as ideias. Aí é óbvio, conforme a gente foi trabalhando música por música, eu ia compondo, finalizando, arranjando, ensaiando com o Rui e o Bruno, e mostrando as musicas pro Paulo.

Reparei que seus 3 discos possuem nomes curtos. Tem o Infinito, Argila e agora o Harlem. É coincidência ou gosto pessoal?

– Eu gosto de nomes singulares, . Originalmente o Harlem era “Songs From The Harlem”, depois a gravadora levantou uma questão importante, por que não faria muito sentido lançar um disco no Brasil com esse nome, então eu sugeri  “ Canções do Harlem ”, mas aí lá fora ia ficar super estranho, e no fim todo mundo ia chamar de Harlem. Enfim, o título original era “Songs From The Harlem”, virou “Canções do Harlem” e a gente optou por deixar Harlem apenas. Mas eu gosto disso. Gosto de letras em caixas baixas também (risos). Eu acho que dá uma unidade pro trabalho. E gosto de nomes que sejam nomes próprios. Acho que Argila chama Argila em qualquer lugar que for. Harlem. Infinito, apesar de ser um nome em português, é um nome. Como se fosse um selo. Esse nome funciona em qualquer lugar do mundo. Acho bacana quando a obra tem um nome.

As suas músicas também ganham nomes muito peculiares.

– As músicas, elas são todas composições que nascem sob uma perspectiva de criação própria. E às vezes você doa essa musica ou se inspira. E isso vem desde que eu comecei a compor musica instrumental. No primeiro disco, a gente abre com uma musica chamada “Veríssimo”, que é uma homenagem minha ao Érico Veríssimo. E eu gosto de nomear as musicas com o nome dos homenageados. Eu fiz uma musica no Argila chamada “Pra Heitor”, que é o Heitor TP. No Harlem acontece isso na “Frisell”. É uma musica totalmente inspirada no Bill Frisell, que eu acho que é um cara da contemporaneidade muito interessante. “Paul Auster” é um nome totalmente próprio, é o meu escritor norte americano predileto hoje, e a gente tá tentando fazer o disco chegar até ele. Deve ser interessante um escritor ver que alguém fez uma musica pra ele. “Rothko” é do pintor Mark Rothko. O Rothko é aquele cara das cores. As formas quadradas em quadros muito grandes, e com cores. Se você escutar “Rothko”, vai ver que as pinceladas sonoras são gigantescas, na minha concepção, e elas vão pra vários caminhos. Então as musicas às vezes nascem e aí eu batizo. E as vezes é um caminho contrário. Eu falei: “Eu quero fazer uma musica pro Paul Auster”. Então eu reli o melhor romance dele, eu tenho quase todos os livros, e tive aquela inspiração meio nova-iorquina sinistra, meio escuridão, você vê que é uma música em tom menor. É uma música que tem um pingo de suspense. Aí ela já nasce nessa perspectiva. Agora os nomes, por exemplo, “Ua:Brari” do Argila, é um nome inspirado em um livro do Marcelo Rubens Paiva, que acontecia na Amazônia. Você quando faz uma musica instrumental, é muito difícil você nomeá-la. Pode chamar “Porta” ou “Janela”. O nome das minhas musicas são como se fossem mais um sentimento mesmo. E eu acho interessante pro ouvinte ter essa coisa de “Meu, são nomes diferentes”. São nomes que não exatamente querem dizer alguma coisa sozinhos.  Então acho que existe um pouquinho de pensamento induzido aí no ouvinte também.

capa_harlemUma coisa constante é exatamente essa coisa de homenagear artistas nas musicas. Escritores, músicos e até pintores. Hoje, quem seriam esses homenageados?

– Eu tenho um projeto. Eu já sei como vai ser o meu quarto e o quinto disco (risos). Isso não é ansiedade, é um planejamento. Meu quarto disco vai ser o resultado de um mestrado que eu estou fazendo hoje na ECA, que é um trabalho de livre improvisação e eletroacústica, então com certeza vai ser um disco muito diferente de música contemporânea instrumental, sob a perspectiva da guitarra. E o quinto disco, eu posso até dar o nome dele, será “Saramago”, que pra mim é o maior escritor de todos os tempos da língua portuguesa, e na minha opinião, talvez o maior escritor de todos os tempos. Mas é difícil por que é dá língua portuguesa, e apesar das traduções, para o público de fora ele não tem o mesmo peso. Nesse trabalho, pois nem sei se vai existir disco ainda, como a gente vê as coisas vão mudando, quando a gente fala em disco hoje a gente diz “a obra”. Se ela vai ter formato A, B ou C. Eu vou fazer um disco inspirado na obra do Saramago, que eu acho que é inacreditável de diversa. Eu diria que o escritor pra mim hoje seria o Saramago, que é uma pessoa que eu várias vezes quis fazer uma musica, mas sempre achei que uma musica só pro Saramago não dá, então vou fazer um trabalho pro Saramago, acho ele incrível. Quanto a músicos, eu tenho escutado muita música moderna, eu quase não escuto música feita com guitarra. Eu tenho sempre meus eternos prediletos no instrumento, que são minhas referências: Hendrix, Jeff Beck,Frisell. Gosto muito do Scofield, Sylvain Luc, João Castilho, Romero Lubambo. Esses caras são, pra mim, pilares que jamais vão deixar de coexistir comigo. Mas eu tenho escutado muita musica sinfônica, muita musica feita no século XX, nem passa perto de guitarra. Até por que eu acho que o formato da música guitarrística, e eu também contribuo com isso, por que eu sou professor de guitarra, sou guitarrista, e meu disco também traz a guitarra como instrumento principal, mas eu acho que chega um momento que você não tem muito mais o que fazer. Isso esbarra desde a concepção tonal, tudo já foi feito na concepção tonal. Eu tentei trazer em Harlem a guitarra como uma voz. Quase todas as melodias do disco são “assoviáveis”, isso eu acho que é um mérito, pra tentar sair um pouco da “doidera”. Tentei fazer um disco bem pouco técnico no sentido “escalar”, “arpejado”, por que eu acho que isso realmente não leva a lugar nenhum, hoje em 2013, no sentido de proposição artística. Eu não estou julgando o trabalho de ninguém, e não estou falando que técnica é ou não importante. Técnica é muito importante. Eu sempre falo: Técnica não é tocar rápido. Também é tocar rápido, e com precisão, mas técnica também é fazer um acorde perfeito, um vibrato, o bend. Técnica é você conhecer o braço do instrumento a ponto de você domina-lo como se domina uma linguagem. A interface que você escolheu naquele momento é o braço. Então, fica atestado que eu não estou falando contra a técnica, pelo contrario. Mas eu acho que artisticamente gravar um disco, seja um disco de rock, ou de jazz…eu fiquei pensando: “Pô, vou gravar um disco de jazz, legal, mas…meu Deus, o que não foi feito já?”. O disco leva um trabalho tão grande pra ser feito, é um filho, ele fica pra sempre. Então, pra que eu vou propor fazer alguma coisa que vai soar como já soou tantas e tantas vezes?. E eu não sou de nova Iorque pra gravar um disco de jazz com aquela perspectiva do cara de lá, eu sou brasileiro, mas ao mesmo tempo eu não nasci no Rio de Janeiro, que tem aquela cosia de samba e bossa nova. Eu sou de São Paulo. São Paulo é essa confusão, essa zona de som. Você anda na rua, é serra, bate estaca, o cara do radio, Rock ‘n’Roll, Jazz. Eu acho que eu misturo as influências naturais pra mim. Então se fosse pra citar um músico hoje, eu diria que me impressiona muito o trabalho do Stockhausen, e o Pierre Boulez, que são os dois compositores do século XX que me impressionam demais. E eu posso dizer um terceiro nome que talvez seja o mais importante desses que eu falei que é o John Cage, que me impressionou muito, tem coisas maravilhosas. E outro de musica sinfônica que eu escuto bastante é um cara já falecido, um italiano chamado Luciano Berio, pois é maravilhoso o trabalho dele. Mas isso são coisas que eu estou escutando agora, de uns anos pra cá. Venho aprendendo nisso. Acho que os meus pilares ficaram nos mesmos. Eu continuo gostando de Miles, Keith Jarret, continuo gostando desses caras, mas eu não tenho alguém novo assim no instrumento, e eu acho que é difícil aparecer alguém. Eu acho que a minha fase de me impressionar no instrumento assim já passou, talvez.

E por que a escolha desse nome, Harlem?

– Harlem é o bairro negro de Nova Iorque. A ideia era fazer um disco que fosse “cantado”, inspirado naquelas melodias da origem da musica negra norte americana, que dá origem a praticamente grande parte da musica ocidental. Essa origem do final do século XIX pro começo do século XX do Estados Unidos, ela da origem ao Blues, ao R&B, a Soul Music, o Blues vira Rock na cidade, vira Rock’a’Billy, vai virar Country no interior, do Blues vem o Jazz, do Jazz e Rock vem o Fusion, quer dizer, tirando talvez a musica latina, cubana, e a musica brasileira, a gente tem na parte ocidental da coisa uma influência muito forte. A guitarra é um instrumento totalmente nascido nesse ambiente. A primeira gravação é de 1948 se eu não me engano, em Chicago, que é a primeira gravação de guitarra elétrica da história com o Muddy Waters. Então você tem um instrumento elétrico que vem dessa origem negra. Mas eu não queria fazer um disco de blues, de novo aquela coisa, “gravar um disco de blues”, legal, mas eu não sou “blueseiro”, se essa fosse a minha praia seria ótimo, mas não é, não soa autentico pra mim eu gravar um disco inteiro de blues. Mas eu queria ter essa concepção da melodia daqueles cânticos gospel. Por que as coisas foram mudando ao longo do tempo no século XX, e principalmente agora no século XXI, então quando a gente fala gospel, ou quando fala em cântico que vem dessa origem, já soa totalmente diferente. Mas é muito forte a tradição lírica que existe nessa musica negra, e que dá origem nessa diversidade toda. Então eu quis fazer um disco inspirado nessa coisa do cantar. Mas aí eu não canto com a voz, eu canto com a guitarra. 

Realmente não dá pra definir o Harlem com nenhum estilo ou ritmo específico. Tem uma variação de estilos bem diversa. E suas musicas passam uma sensação de trilha sonora as vezes. 

– Sim, e é natural isso. As melodias nascem primeiro. A “Folie” já nasceu aquela coisa meio brazuca, aí veio a questão da orquestração, mas ela erabrazuca desde o inicio. A “Harlem” meio bluesy, por isso que é a faixa titulo, mas também tem um pouco da coisa brasileira. Uma instrumentação mais brasileira, menos americana. Mas eu forcei a “onda” pois eu não queria gravar um disco de samba, eu queria que esse disco fosse mais cosmopolita mesmo. E a coisa do visual, que já vem também desde o Argila, e talvez eu tenha tentado fazer isso com o Infinito, mas até por condições da rapidez das gravações, no fim a gente não conseguiu desenvolver isso. Eu acho que a minha musica tem esse apelo cinematográfico no sentido de que a ideia é que ela leve o ouvinte pra algum lugar. Quando a gente fala de clima em musica, a gente está falando de percepções e sensações que são muito facilmente transfiguradas para o visual. Por exemplo, a “Paul Auster” pra mim tem aquela coisa de Nova Iorque, uma névoa, um clima da década de cinquenta meio noir, meio densa dos filmes. Isso é até antigo, nem existe mais, você vai pra lá hoje é uma zona, todo mundo buzinando, falando no celular. Na “Arpoador” eu acho que é aquele entardecer, tem toda aquela representação de estar no Rio de Janeiro, de frente pro mar. “Folie” quer dizer folia em francês, mas folie é no sentido de bagunça mesmo. E a “Folie” propositalmente tem essa sensação de como se chegasse um monte de criança numa casa e fossem destruindo tudo, aquela coisa toda. Propositalmente ela tem esse desarranjo. O Bruno queria grava com bateria e eu disse que queria uma percussão. Daí ele sugeriu a Tabla. Propositalmente a gente foi buscar outro caminho, meio confuso, no sentido dessa coisa da folia. Eu acho que as musicas, elas passam uma imagem, sempre. Eu escuto musica instrumental por imagem. Gosto de escutar musica de olhos fechados. Pra mim é sempre em imagens.

EntrevistaGtrExp14aMúsicas como a “Frisell” e “Beck-O-La” possuem uma sonoridade pop muito bacana, são como você disse, assoviáveis. Em seus discos sempre tem essas musicas com esse apelo.

– Sempre tive isso, vai mudar no próximo disco, vai ser bem diferente, eu quero apostar num outro formato. Eu fecho um ciclo interessante com o Harlem. Agora no caso específico da “Frisell”, eu sempre gostei disso, e quando escutei o Frisell, eu pensei “caraca, olha o cara aí”. A gente sempre acha que táchegando na frente, e sempre tem alguém que tá na sua frente. Obviamenteele tem uma concepção inacreditável. Aí eu fiz a musica, ate no formato da cadencia, inspirado muito no disco Nashville, que eu escutei muito quando estava no LAMA. Foi o primeiro disco que escutei do Frisell. Me impressionou bastante a simplicidade dele. Por que entortar por entortar me enche muito o saco. Eu fico muito sem tesão logo, de botar acordes com clusters, e tal, mas aí tem um momento que perde aquela coisa, pois parece que o cara começa a fazer aquilo pra mostrar o quão complexo o voicing é. Pra mim deixa de ser musica, e passa a ser um puta estudo de harmonia, por exemplo, que é animalmas ai já não é musica, não é obra. Pra mim, eu fiz uma obra, como um quadro, um livro. Se eu vou fazer um estudo de “All The Things You Are”,“Stella”, ou um estudo de inversão de acordes, de cluster, é um estudo. E eu não quero que um estudo vire musica, no sentido da minha concepção de arte. Então eu tento fazer coisas em que a melodia nasce primeiro, e eu vou rodear elas. E muitas vezes, ciclos harmônicos podem ser muito mais simples do que necessitariam ser. Eu acho que isso só funciona, de ficar “emperequetando”, pra quem é musico, e eu não quero fazer musica pra musico. Então eu não vejo necessidade de ficar enchendo de “cacho de uva” pra quem não e musico. Eu estou fazendo musica. E eu acho muito legal a coisa que o Frisell tem, que a musica dele tem, que é essa coisa do clima. E você vê que varias vezes eu dou dicas de que vai o clima pra cá, e de repente muda, maior ou menor, tons homônimos. Na “Arpoador” tem também a questão cíclica, que vai mudando de tonalidade. Eu uso algumas ferramentas, alguns ganchos tradicionais de composição, orquestrais mesmo, mas traduzindo pra coisa do “feeling” de levar o ouvinte pra uma sensação. De novo a gente cai na questão da sensação. Mas eu acho que fazer uma estrutura complexa per se não me diz nada. Vira um estudo. Aí a gente volta na questão do que é arte hoje. Muita gente faz coisas achando que é arte, e sei lá, às vezes tá faltando estofo, como diz o Regis, falta estofo às vezes pra você propor aquilo como arte.

Na “Frisell” tem ótimos sons de violões. Como foram gravados?

– Aí entra muito o Paulo Assis na concepção. A gente sempre se preocupou com o som, e não com a tradição. Os meus discos antigos foram gravados no formato tradicional, que foi muito legal, um aprendizado enorme. No Harlem a gente se preocupou com o som. Então tem desde captação com 3 condensadores com violão acústico, até o uso do piezo que está em uma deminhas guitarras, com o som de violão de aço. A “Frisell” por exemplo, tem violão de aço tradicional, violão de aço pelo piezo da guitarra, violão de nylon captado com condensador, e o Godin que tem o piezo da LR Baggs. No caso do que eu tenho, é o condensador dentro do tampo do violão, com o cabo XLR. Então quer dizer, é uma mistura. A gente fez outras coisas malucas. A gente chegou a gravar a guitarra em linha, passando depois pro amp, microfonando oamp e passando de novo para os processadores de som. A gente gravou guitarra pura só com reverb, a gente fez muita maluquice, e isso também tem essa proposta. Eu queria alguém pra mexer no som, e muitos dos timbres doHarlem nascem com a concepção do Paulo Assis. É o disco que eu menos opinei sobre timbres. Eu sempre fui muito duro nessas coisas, “Eu quero assim que quero assado”, eu briguei muito com o André Ferraz nos dois primeiros discos (risos). Dessa vez larguei um pouco isso pra também experimentar, e eu acho que fazer musica instrumental é experimentar um pouco. Você não pode ser o compositor, o interprete, o produtor, o dono da banda, o que toca, o que paga a conta e o que recebe. Quer dizer, tem uma hora que você tem que deixar um pouco a cargo do outro, mesmo que você não concorde cem por cento, no fundo essa diversidade de opinião faz bem pro trabalho, por que senão você fica naquele disco que só tem a sua cara, do seu jeito, e o seu jeito nunca é o jeito do outro. Então é bom deixar um pouco aberto.

Rolou gravação ao vivo?

– A gente gravou as cozinhas juntos. E junto comigo fazendo guia. Acho que uma guia virou oficial. A gente gostou e deixou. Mas as cozinhas foram junto sim.

Eu notei uma carga de ‘drive’ a mais nas musicas do Harlem. Há um número bem maior de guitarras rasgadas do que nos discos anteriores.

– Se você pegar o Infinito, o Argila e o Harlem, você verá que eu não tinha feito isso antes, então era um caminho meio natural. E estruturalmente pra fazer a guitarra “cantar”, o drive me possibilita que eu tenha uma concepção de homogeneidade do som maior do que a guitarra limpa, então nós optamos sempre por um som um pouco mais pesado e denso pra que eu pudesse fazer essas melodias na guitarra mais encorpadas. Eu não quis fazer um disco de rock, mas é um disco mais aberto. Mas tem muitos sons limpos de guitarra que não parecem guitarra. Tem também guitarra portuguesa na XXV, XXVII, que é um instrumento que eu trouxe de Lisboa, uma afinação totalmente diferente,com 10  cordas. Tem sons de guitarra limpa que parecem sintetizador, mas são sons de guitarra. Eu optei por usar um pouco mais de drive sim, um pouco mais “on the edge”, um pouco mais de pressão talvez. Por que também eu não tinha feito isso antes, e eu quis experimentar um pouco mais. E ainda vou chegar a gravar discos mais barulhentos eu acho. Por que a guitarra tem uma característica elétrica barulhenta. (risos). Basta ouvir o Zero Tolerance For TheSilence do Pat Metheny pra você ver onde a gente pode chegar com o barulho. Imagina um disco do Pat Metheny que inspirou o Sonic Youth. Existe uma concepção que é diferente de botar um drive no 10. Peso não é quantidade dedrive ou distortion. Muita gente quebra a perna nesse sentido de querer sempre mais peso, e vai botando 2 ou 3 pedais, tudo no 10. Peso é “gordura” de som. E a gordura de som se consegue timbrando, com o captador, corda, jeito, pegada e também amplificação e manuseio. Nunca usar os presets. A gente virou de cabeça pra baixo os sons. A gente ficava duas horas as vezes mexendo num som pra fazer um take de 30 segundos. A gente gastou muito tempo na timbragem desse disco. São mini detalhes que duram segundos mas que pra serem feitos demoraram 2 ou 3 horas.

Você também tocou a guitarra portuguesa, alguns pianos e synth.

 – Piano eu fiz uma ou duas coisinhas, só arranho, mas dentro dessa concepção que eu queria pro disco eu achei que seria interessante. A guitarra portuguesa e um instrumento maravilhoso. Eu não afino da forma tradicional, eu afino em paralelo da guitarra. Afinação em quartas, e da terceira pra segunda corda em terça maior. Só que eu faço uma quinta justa abaixo, pois não teria como afinar uma oitava acima da guitarra, não daria certo. Então quando eu toco um formato de Dó maior, ela está soando uma quinta abaixo, ou seja, um Sol maior. Na verdade eu afino com uma simetria pra eu não ter que aprender a tocar o instrumento na sua afinação tradicional. Senão eu teria que me dedicar a isso, e hoje na minha carreira eu não teria tempo, não é que eu não queira. Mas foi legal, eu fiz uma musica com a guitarra portuguesa, a “XXV, XXVII” foi composta nesse instrumento, que é tradicional do Fado Português. Quando fui pra Lisboa em 2011, comprei esse instrumento de um luthier, mas obviamente eu não iria usar tocando fado (risos). Eu até uso com a Fafá, mas não no meu disco. Então a guitarra portuguesa entrou como um instrumento de composição também. É uma coisa que a musica contemporânea sinfônica, contemporânea erudita, seja lá o nome que se dê, de vanguarda tem, que é pegar a instrumentação não tradicional e trabalhar com a sonoridade.

EntrevistaGtrExp17aE esse trabalho com a Fafá? Isso influi nas suas composições também?

Eu tô com ela desde 2010, quase 4 anos. Três viagens pra Lisboa, Brasil inteiro. Me inspira como musico. Era uma das coisas que eu queria fazer, pois não tinha feito ainda. É um trabalho que representa muita importância pra mim, mudou muito a concepção no jeito de tocar. Já toquei com ela pra mais de 30 mil pessoas, a gente toca em palcos muito grandes, em situações de muito risco pois ela muda o repertório sempre. Existe um trio principal da banda que é Tico na bateria, o Caran no piano e o Loyola no baixo, que estão com ela a 30 anos. São músicos que vem da década de 60, então é completamente diferente. O Loyola é o cara que gravou eu e a brisa do Johnny Alf, musica seminal da bossa nova, quando tinha 18 ou 19 anos. É um cara que já fez de tudo, e tem uma história no contrabaixo que é inacreditável. Tocar do lado dele, do Caran, um super arranjador, o Tico, o primeiro baterista do Brasil a usar bateria eletrônica na década de 80. Caras que gravaram todos os discos de cantores que você possa imaginar. E isso me da muito respaldo. Tocar com eles, ser aceito nessa situação. Um lugar onde já tocou Sandro Haick, Tomati,Tuco Marcondes, músicos excelentes. Estar com eles me dá um respaldo no sentido de que eu estou com eles de igual pra igual, eles me aceitam, a gente se dá bem dentro e fora do palco. E isso me inspira como musico. Mas em composição, tirando o fato da guitarra portuguesa que foi em uma das viagens, não muda muito. Abre muito a cabeça, e cria também condições de resolver situações perigosas ao vivo, por que a gente realmente é obrigado a “se virar nos 30” (risos). Muitas vezes você toca com monitor, e não está se ouvindo, táacontecendo o show, e o show não pode parar (risos).

Em determinado momento há uma vinheta que nos remete a melodia de “Paul Auster”. Tem um carinho especial por ela?

– Eu tenho carinho por todas elas. Há outros momentos que acontece isso. Na“XXV, XXVII” há uma citação da “Rothko” no final da musica. Então há essa costura. São 10 faixas que representam uma obra, então elas são costuradas. Em varias musicas vão entrando sons, vai chegando a próxima. Eu não quis fazer isso toda hora senão perde a graça. Tem dois ou três momentos que acontece isso. Não é muito claro, tem que estar atento pra pegar, são momentos bem distintos, com instrumentações distintas. Eu gosto de todas obviamente. Gosto muito da “Paul Auster”, é uma musica que nasceu totalmente no violão. A “Beck-O-La” é uma balada. Eu queria gravar uma balada que a gente pudesse cantar na voz. Gosto de todas. Sou o pai, não posso escolher uma (risos).

E quanto aos equipamentos?

– Uma diversidade enorme de coisas. Todos os meus instrumentos foram usados. Eu uso hoje principalmente duas guitarra MusicMaker, a Paulkaster,que é uma telecaster de Ash semiacústica. A Strato que tem o piezo, as duas tem Sergio Rosar, trastes de inox, a Strato tem o piezo da Graphtech. Essas foram usadas extensivamente. A gente fez umas coberturas com guitarras antigas, duas guitarras que o Paulo Assis tem, uma Les Paul e uma Strato. Eu usei pra ter layers diferentes. Um violão Cort de aço, o Cafe do Ulisses Rocha,o Godin, a guitarra portuguesa, um outro violão acústico da Di Giorgio, um 12 cordas que eu não lembro a marca. Foram usados duas captações com oFalcon 212 da Meteoro, um outro amp do Paulo Assis, um tranzistor, e muita coisa de soft synths, mais de 20 pedais. Delay, chorus reverb, o nova systemTc Eletronics, M13 Line 6, Guitar Rig com Rig Control, Wha-Wha’s Dunlop,Onner, as vezes só aberto no meio, mudando a frequência. Não sei nem se dá pra listar tudo isso. Eram paletas disponíveis. A gente usou uma infinidade de processadores de guitarra, que eu queria explorar esses sons também. Eu acredito nisso. Vai soar meio polêmico, mas se Hendrix estivesse vivo hoje, ele não estaria olhando pra sons de 40 ou 30 anos atrás, ele estaria olhando com o que mais temos de tecnologia pra frente, que é o que ele fez na época. Só que todo mundo pega essa tecnologia hoje e fica tentando simular um ampvalvulado de 63, eu não entendo o sentido disso. E o que é pior, quase todo mundo que tenta simular um amp de 63, nunca escutou o amp original, então não é um simulado, é um simulacro. Se você procurar o significado dessa palavra, é a tentativa de simular algo que você não sabe o que é, não existe. Édoideira isso. Se a gente tem tudo isso hoje, pra que tentar ficar soando como um amp valvulado de 70 bicho, olha pra frente. Quanta coisa nova da pra fazer com a guitarra. Um instrumento elétrico que por natureza sem eletricidade ela não tem som. Você tem uma possibilidade com tanta coisa, eu cresci numa época que era difícil ter as coisas, meu primeiro pedal eu fiquei meses só usando ele. Quando tive um delay, era inacreditável. Eu escutava o Gilmourque queria saber como ter aquele som. A gente não sabia teoria, mas a gente usava, explorava na cara e na coragem. Hoje é muito legal, o cara compra, baixa, vai no YouTube, o cara ensina a usar. Só que eu acho que se perdeu um pouco a referência sonora artística, e também de estudar. É muita coisa, você não tem mais o tempo de assimilação.

A capa do disco ficou muito bacana, qual a história dela.

– Essa capa tem chamado atenção em todos os lugares. Sempre gostei dessa ideia, mas me surpreendeu que praticamente 100% das pessoas que vieram falar sobre o disco comigo, comentaram da beleza da capa. Essa é uma foto da Camila Fernandes, fotógrafa aqui de SP. Ela foi pra Nova Iorque e eu pedi pra ela fazer algumas fotos do Harlem. Está é uma foto do Harlem. Não tem nada mexido ai a não ser um ajuste de cor. Mas a foto original é muito similar ao que essa foto é. Ela foi me mostrando várias fotos, e na hora que eu vi eu falei “éessa foto”, e desde então a capa não mudou mais. Essa foto tem a quadratura perspectiva incrível. É uma foto urbana do bairro, e tem um cara subindo na bicicleta, você vai vendo no meio da rua meio que solidão no meio da cidade. O farol fechado lá na frente. Quer dizer, representa muita coisa. A cor do tijolo, a cor dessa urbanidade, e tem uma coisa meio antiga. Deu certo a foto e a capa ficou matadora. Não e pintura, montagem, nem truque, é uma boa foto.

Como você encara esse “novo mundo” de mídias digitais e essa queda enorme no que diz respeito a venda do disco “físico”?

– Eu acredito em disco ainda, o formato na minha opinião vai acabar sendocomo acontece hoje com o vinil. Vai entrar em um nicho de compradores. Émuito raro hoje escutarem disco como obra. Então na verdade estamos na contra mão, mas é bom estar na contra mão, por que também faz essa diferenciação dessa loucura de mídia social, onde todo mundo acha que virou artista, todo mundo acha que é só gravar qualquer coisa em casa e lançar. Eu demorei dois anos pra fazer um trabalho, fechar uma etiqueta, pra colocar um selo. A capa, a foto, o trabalho gráfico, a costura das musicas, a caixa. Eu acho que isso diferencia, por mais difícil que seja, diferencia o trabalho. Acho que o disco vai existir sempre. Por mais que mude o formato, o trabalho vai existir sempre. Vai entrar num nicho, cada vez você tem mais a perspectiva de compradores segmentados. A gente vai partir o ano que vem pra venda digital também, no iTunes, na Amazon, como obra, só que ai você não tem mais controle da obra, pois a pessoa pode comprar faixas separadas. O Harlemperde um pouco o sentido se você escuta a faixa 4 e depois a 1, por que a costura não é mais a mesma, mas isso é uma coisa inevitável, mas a obra vai sempre existir, sempre tem essa opção. Eu acho que não morre, como não vai morrer o livro, como não morre o cinema, como nem o vinil morreu. É um nicho, você não atinge todo mundo ao mesmo tempo, não fala com todo mundo ao mesmo tempo. Eu acho que com o passar do tempo esse trabalho se paga artisticamente, pois que isso vai diferenciando você dessa névoa de mesmice ideológica, essa homogeneidade, esse pensamento que eu chamo de ovelha, carro branco, um pensamento meio que “o que vale mais é quantos views deYouTube você tem do que a musica”. Eu aceito isso, participo disso. Tenho lámeu site, vídeos, entrevista, Facebook, mas eu não valorizo isso, quando isso passar eu vou sobreviver por que eu tô fora disso, vai ter muita gente que quando isso passar não vai sobreviver por que não tem nada que sobre, além disso. Sorte pra todo mundo, pelo amor de Deus, não estou falando que sou melhor que ninguém, pelo contrario, eu estou inserido, mas eu acho que você é o que você planta, então você tem uma constância nessa ação e reação. E eu acho que o disco é uma ação que vai gerar uma outra reação na cadeia da sua carreira.

EntrevistaGtrExp23_peqa Como o André Martins agiria então se começasse a carreira nos dias de hoje?

 – De uma certa forma essa pergunta é irrespondível. Mas eu vou te responder como eu acho que dá. Tudo e questão de formação. E na sua formação vocêacredita em algumas coisas, e outras não, então você aprende o que é certo e errado, os valores. Se eu tivesse começando hoje, com 20 anos, eu ia fazer o possível pra estudar muito, tentar descobrir as pessoas que pudessem me trazer experiências e ensinamentos, como eu fiz no passado. Fui viajar, larguei carreira, era redator de agencia de propaganda, larguei e fui atrás do que eu queria. Estava estudando na fundação das artes e tal, mas no Brasil não tinha o que eu queria, então eu mudei minha vida pra isso. E gravaria discos, gravaria por que existe um valor intrínseco na obra. Agora é óbvio que, quem não vem disso talvez tenha uma dificuldade maior de entender. Mas você tem que entender que a gente está falando dessa mesmice de pensamento. Se todo mundo tá olhando pra um lado, primeiro, questione. Se todo mundo tá falando que uma coisa é azul, será que é azul mesmo? Ai você começa a olhar e percebe que é verde. Ai você fala: “pô bicho, não é azul, é verde…mas tá todo mundo falando que é azul”. Então pode ser do interesse de alguém ou de“alguéns” que seja azul. Então já começa uma outra ideologia. Eu sempre fui muito questionador. Libertário e questionador. Li muito, então eu acho que isso abre a cabeça. E veja, eu não estou falando de estilo. Não é rock, ou Jazz. Eutô falando de pensamento de carreira, de vida. Se tá todo mundo fazendo igual, a mesma coisa, se tá todo mundo no mesmo lugar, se tá todo mundo nofacebook…eu tive uma experiência de ficar um ano e meio fora do facebook. Eu voltei agora por conta do lançamento do disco, por entender que existe um mercado que precisa ser suprido com esse tipo de informação. Mas pessoalmente foi um ano e meio sabático muito interessante. E o mais incrível é: Eu não mudei nada na minha vida a não ser ficar esse tempo fora dofacebook. E muita gente falava “André, mas o que aconteceu? Por que você sumiu?” eu respondia “Não aconteceu nada, ta tudo muito bem, muito bom e eu não sumi, eu continuo com o mesmo e-mail, o mesmo celular, o mesmoendereço, o mesmo lugar de trabalho, eu só sai dessa jaca”. E isso me fez pensar muito. Foi importante fazer essa reflexão. E eu queria ficar mais tempo fora. Eu não quero ser o cara que hoje fica na Galeria do Rock, tomando cerveja quente e falando que o Deep Purple não é mais o mesmo (risos), ou que bom mesmo era o Led Zeppelin no segundo disco. Por que o tempo passa, o meu trabalho tá ai, gravado com tecnologias novas, com experiências novas, eu tô fazendo um mestrado na USP sobre novas coisas, tô escutando novos compositores, tô participando de uma banda na USP, com uma concepção de livre improvisação, que é uma linguagem completamente diferente do que a gente usa desse lado do mercado. Então eu sempre estou me levando pra coisas novas. Então eu falei, “eu vou voltar pro facebook”, mas eu domino isso, e não ele que me domina. Eu conheço gente hoje que não consegue largar essa dependência do facebook, do iPhone, do “online”. Conheço gente que teria até problemas psicológicos se essas coisas sumissem, a vida ficaria sem sentido. Então eu acho que isso reflete a maneira que essa nova geração deve encarar as coisas. Leia mais, estude mais, procure ouvir musicas diferentes. Se tá todo mundo falando que o fulano de tal é legal, ok, mas se você não acha legal, assuma que não acha legal, não goste por que está todo mundo falando. A mesmice não serve, a unanimidade é burra. Sempre seja um ponto questionador.

 Fale dos músicos que gravaram contigo.

 – Outra coisa que foi feita de propósito. No primeiro trabalho, foi uma premiação, fizemos um disco em conjunto, todo mundo junto. No Argila, aquela profusão de gente, cada um tocando diferente em uma faixa, vários convidados. No Harlem, eu queria que fosse um baixista, que foi o Rui Barossi, baixo acústico e elétrico. O Bruno Iasi, bateria e percussão. E eu queria o Paulo Assis como engenheiro de som, que acabou virando o quarto elemento, pela concepção sonora. Ele ultrapassou a técnica da engenharia de som pra virar um contribuinte nas timbragens, criou algumas vinhetas, então ele entrou como quarto integrante. O Rui e o Bruno tocam já a alguns anos comigo ao vivo. Tenho um trio que as vezes vira quarteto com o Ricardo Giuffrida. Eu estou em um semestre extremamente ocupado com o lançamento, a divulgação e o mestrado, shows com a Fafá e as aulas. Então a gente tá fazendo a divulgação primeiro, a entrega física em loja, e toda a parte da mídia, entrevistas, sites, onde encontrar o disco. A gente vai usar esse período do fim do ano pra fazer essa parte, pois queremos que o disco esteja bem distribuído ate chegar dezembro. Vai ter um show em janeiro, a data ainda a definir. A gente vai fazer um show de lançamento do disco, provavelmente no Rio de Janeiro também. Eu gosto da ideia de fazer um show de lançamento dotrabalho. A gravadora também acredita na venda digital, acho que estará disponível a partir de janeiro. E fazer clínicas também pra falar desse trabalho. Infelizmente hoje no Brasil não existe um circuito de musica instrumental. Se eu quiser pegar meu quarteto e ir pra recife, eu não vou conseguir por que são quatro passagens aéreas, estadia, cachê. Infelizmente, fora o eixo Rio-São Paulo, a gente se sustenta muitas vezes indo sozinho. As vezes vou fazer uma clínica, workshop, e falo um pouco do meu trabalho. A gente não tem o circuito que existe em outros lugar, principalmente na Europa e nos Estados Unidos, onde por exemplo, o Scofield pega a banda dele e excursiona dois ou trêsmeses tocando as musicas que vai gravar, daí entra em estúdio e em uma semana grava o disco. A gente não tem essa possibilidade, economicamente falando. Então a gente faz da maneira que a gente consegue fazer. O disco vai estar na Livraria Cultura, Livraria da Vila, Saraiva, na Pop’s, Freenote, Livraria da Travessa e Loja Tracks (RJ). No meu site tem o link direto para o BRMusicStore, que é a loja virtual da gravadora, lá tem a listagem de todas as lojas disponíveis pra venda física. Você pode comprar também diretamente do BR MusicStore. A partir de janeiro vai estar na Amazon, iTunes. É um trabalho que vai estar disponível, quem quiser vai ter como achar. (risos).

Essa é o seu segundo disco pela Black Records. Como é essa parceria?

Sim, o segundo disco já. O infinito eu também estou levando pra Black Records digital. Não sei se faz muito sentido lançar agora nesse próximo ano, o disco físico, mas ele vai pro catálogo da Black também. A Black Records sempre apostou muito em mim, eu tenho total confiança. Acho que parceria é isso, confiança. Eu tive parcerias minhas no passado que lançaram alguns trabalhos meus de livros, DVD’s, que foram muito ruins. Alguém ganhou muito dinheiro e eu não ganhei quase nada. Eu sei de livros meus que se esgotaram com tiragem de 15 mil exemplares, e eu não ganhei nenhum centavo. Está em negociação um processo, enfim. A parceria com a Black Records funciona, é cristalina, de confiança absoluta. A Black Records é hoje no Brasil um dos poucos selos que tem uma diversidade muito grande: Dado Villa-Lobos, João Castilho, Rafael Nery. Artistas muito diferentes entre si, mas que tem trabalhos instigantes. E funciona. A distribuição, divulgação. É um selo muito honesto e muito profissional, no sentido de levar o disco, fazer as negociações. Voltando naquele ponto sobre não ser o cara que faz tudo sozinho, você tem que ter gente te ajudando. A Black faz isso muito bem, levando isso que a gente produz no estúdio até o publico.

Além de homenagear escritores em suas musicas, você também escreve. As colunas Guitarra Zen tinham muitos leitores. Existe alguma possibilidade disso virar livro?

Eu gosto de escrever. Se não fosse músico, eu seria escritor. Viveria de alguma forma escrevendo. Fui redator em agencia de propaganda, conheci um pouquinho da época áurea da propaganda brasileira, que também passou por essa transformação maluca, mas eu conheci alguns dos grandes nomes. Trabalhei nisso durante 2 ou 3 anos, por opção larguei por que a musica sempre falou mais forte. Acho que vai ser sempre assim, literatura sempre vai inspirar as obras. Não acredito que isso acabe um dia. Uma das coisas que eu mais gosto de fazer é ler. Quanto ao Guitarra Zen, eu tenho todos esses textos, aos poucos estão entrando no meu site novo. Eu tenho uma negociação com uma grande editora pra lançar o livro, mas está emperrada por minha culpa, de não ter ido mais atrás por falta de tempo. Não sei, mas acho que pode ser que um dia saia uma compilação, mas vou escrevendo de outras formas, outros lugares, outras mídias, mas o que a Guitarra Zen fez na época foi muito bacana, propôs algo novo. Isso pode acontecer de novo, não necessariamente como Guitarra Zen, mas de outras formas. Literatura é muito importante, sempre foi e sempre será.

Você sabe que ajudou muita gente através dos seus textos no Guitarra Zen. Qual mensagem você deixaria hoje para as pessoas que vão ler essa entrevista?

Eu fico sempre muito feliz. Até hoje continuo recebendo mensagens. Cheguei a receber carta, depois e-mails, essas coisas. As pessoas realmente gostam, eu fico impressionado como isso tem durabilidade. Isso tudo foi feito muito de coração, como todos os meus trabalhos, e também esse disco, ele carrega muito coração. Então uma mensagem pra quem está lendo, pra quem vai ler, pra quem ouve, quem tá começando, e quem já toca a 40 anos, quem tem o sonho, quem tinha o sonho. Faça as coisas com seu coração, é muito obvio, meio clichê, é como falar de amor, aquela coisa, todo mundo fala, mas são poucas as vezes que a gente usa. Fazer as coisas com o coração faz as coisas ganharem vida. E quando as coisas ganham vida, elas ganham cor, ganham sabor, ganham diversidade. Acho que o que falta hoje no mundo é mais vida, mais coração, mais pureza. Estudem, leiam, procurem praticar o máximo possível, mas façam com o coração. Não entrem na leva do senso comum. Faça o que você gosta, o que você quer, com o coração. Pode ser devagar, pode ser muito devagar, mas você vai conseguir atingir os seus objetivos, as suas vontades, atingir as pessoas, de uma forma ou de outra você vai chegar até elas.

Obrigado a equipe do Guitar Experience por mais essa oportunidade. E escutem o Harlem, se gostarem, comprem, o físico ou digital, prestigiem, por que a gente também precisa da divulgação de todo mundo, dos leitores, dos fãs, dos outros artistas, das outras mídias. A gente precisa muito divulgar o nosso trabalho.
(entrevista gravada e transcrita em setembro de 2013, São Paulo)

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