Fred Andrade faixa-à-faixa (Por Roberto Nascibem)
Fred Andrade, pernambucano, é compositor, guitarrista, violonista e Mestre em criação e execução musical pela Universidade Federal da Bahia. Possui em seu currículo inúmeras apresentações acompanhando vários artistas e vasta experiência em gravações de trilhas.
Em 2000 lançou seu primeiro álbum, Ilusões a granel; em 2005 foi a vez de um CD focado em frevos de rua chamado Guitarra de Rua; 2006 concluiu e lançou Farra de Anjo (trabalho que contou com a participação de muitos convidados da cena instrumental nacional) e em 2009 o CD Pele da alma.
Durante este período, mais precisamente no ano de 2002 lançou um CD em parceria com o baterista Ebel Perrelli, chamado Projeto Mandinga. Com Perrelli também gravou o DVD Mandinga (Duo) 2012. Hoje, além da carreira como solista, o músico faz parte do Sexteto Noise Viola que possui dois discos. Seus trabalhos atuais são: O dvd Guitarra Pernambucanae os cd’s: Umbral (violão solo), Sacrifício pela fé (guitarra solo), um disco atrelado ao seu projeto de mestrado chamado Infinito, onde o músico utilizou diferentes formações instrumentais, além do cd Um dia, em parceria com o grupo Membrana.
Gentilmente, o guitarrista fez um faixa-à-faixa para o portal Guitar Experience, explicando detalhes e curiosidades do novo trabalho:
CABÔCO NO LINHO– ¨O nome é uma brincadeira com a palavra ´caboclinho´, que é um ritmo de origem indígena, bastante presente na música pernambucana; é tocado com bumbinho, flechas…Pedrinho Mendonça e Dudu Prudente, que são percussionistas, fizeram essa reprodução da música folclórica do caboclinho. Ela é modal, eu até brinco com o pessoal do conservatório dizendo que minha música, ou é tonal ou modal, eu flerto com os dois e chamo de tudal (risos). O tema está mais pra modal (Ré dórico), o siestá ali insistindo, a 6ª maior está bem presente e o motivo já ´desenha´ a célula rítmica do caboclinho. No decorrer da música tem a gaita e o violão (Júlio Rêgo e Ricardo Vieira) fugindo um pouco do modalismo e há algumas coisas com cadência plagal também¨.
DE JOELHOS– ¨É a segunda música do álbum, já foi gravada no disco Pele da Alma (2009), está presente no DVD Guitarra Pernambucana (2010) e existe também uma versão dela para orquestra sinfônica, com duas guitarras, que fiz no meu mestrado na UFBA (Universidade Federal da Bahia); eu gravei com a sinfônica de Sergipe e na ocasião eu chamei o Edu Ardanuy, que já tinha tocado essa música comigo umas 15, 20 vezes em festivais pelo país. Nessa gravação atual, fizemos com guitarra, violão de 7 cordas, duas percussões e gaita. Na versão original eu fazia o tema com uma viola, substituída agora pela gaita. A levada é meio que um bolero, misturando tonalismo e modalismo; o tema é modal (dórico) e a parte Bé mais tonal. Ela virou meio que um hino aqui em Recife, bastante tocada pela garotada, até Robertinho de Recife eu já vi tocá-la. É uma música que eu tenho um carinho arretado!¨
FEBRE DO RATO– ¨Já tinha gravado ela num disco bem antigo chamado Farra de Anjo (2006). Na época eu gravei em andamento bem acelerado, acho que 170bmp…É um xaxado e que as pessoas costumam confundir com baião; eu acho o baião um pouco mais minimalista em termos de levada, com mais elementos. Dizem que o xaxado é uma dança criada pelos cangaceiros e fala-se nessa onomatopéia das sandálias se arrastando, ditando o ritmo. A versão origina era baixo, bateria, guitarra e viola; posteriormente ela entrou no meu projeto de mestrado com arranjo para orquestra de violão (com 13 violões), com orientação do professor Robson Barreto, uma figura maravilhosa, um violonista sensacional. O arranjo é de Ricardo Vieira, de Aracajú, que toca no Membrana. O tema é modal, misturo lídio/mixolídio e adiciono a 9ª bemol para dar um sabor de coisa moura. Eu acredito nesse parentesco do nordeste com a música árabe; se você visitar os mercados em Pernambuco, você vai notar essa coisa árabe até no jeito de falar, os melismas, a entonação, acho de advindas de lá mesmo. Nessa canção, a gaita dobra o tema comigo¨.
LÁ VEM A VOLANTE– ¨É uma música que eu fiz para um documentário sobre Lampião. Ela foi encomendada pelo diretor da Tv Universitária (Cultura) de Recife, Luiz Lourenço, que na época era meu aluno. Esse documentário acabou virando uma mini-série chamada ´O Reinado de Lampião no Raso da Catarina´ e acabei gravando esse tema num disco chamado ´Sacrifício pela fé´, que é um disco de guitarra solo mesmo (sem banda) e tenta traduzir aquela atmosfera do cangaço. Eu peguei esse mote de Lourenço, tomei gosto, eu já gravava algumas coisas sozinho de guitarra solo ou violão, aliás sou bacharel em violão e aproveitei e fiz um disco sozinho. Volanteé a polícia que perseguia o bando de Lampião e eu tento levar pra essa situação, a coisa imagética dessa música.
No meio tem uma ladainha, ela está em Cm, modal também, só que eu misturo os modos dórico com eólio. O eólio entra exatamente quando acontece essa ladainha no meio, do meio pro final, tipo uma procissão mesmo, eu achei o clima bonito, bem propício pro menor eólio. Originalmente eu gravei essa faixa com fuzz, com uma guitarra mais suja, pesada. Para o cd Infinito eu fiz uma versão bem mais doce, tocando viola e Rafael Santiago na marimba. Essa versão do Membranaé um pouquinho mais acelerada que a original, toquei de uma maneira mais arrastada, mais contundente¨.
PAU NA CANECA – ¨O primeiro fonograma dela foi em 2006 no disco Farra de Anjo, com baixo, guitarra, bateria e viola. Ela também entrou no dvd Guitarra Pernambucana, portanto, essa é a terceira versão dessa música. Ela tem umas brincadeirinhas de country, que é um estilo que eu acho massa. É um frevo meio rock, é um frevo no ritmo mas não é um frevo na forma. A forma do frevo geralmente é ABAe ´Pau na caneca´ não segue isso, ela tem uma estrutura de mais de três partes. A levada rítmica é de frevo, tanto nas frases, perguntas e respostas, quanto na percussão; é modal também mas flerta com o tonalismo o tempo todo. No meio tem umas partes que lembram Nirvana, Silvechair que são bandas que eu curto, aquelas quintas paralelas meio nonsense, saindo do tom¨.
CONVERSANDO COM PAGÉ – ¨É uma composição inédita, uma homenagem à Jimmy Page, que é um cara que, se eu pudesse, eu rezaria um terço pra ele todo dia (risos)…Gosto demais como guitarrista e compositor, admiro demais o Led Zeppelin. Eu tento fazer uma ponte entre o sertão e as coisas do Led; toquei ela com slide, afinação aberta (D), tem uma melodia até lúdica eu diria, um clima de brincadeira talvez, contrastando os riffs de rock´n´roll com uma melodia bem jocosa, gosto demais¨.
LUZ DE LED – ¨Também uma homenagem ao Led Zeppelin, uma vinheta eu diria, pra fechar o disco. Riffs com um pouquinho de modalismo, quartas aumentadas e uma brincadeira com tons inteiros no meio. Eu gosto de flertar com música impressionista, gosto demais de Debussy, Ravel, esses caras impressionistas e de vez em quando eu misturo o nordeste com coisas que me vem à cabeça com tons inteiros, hexafônicos e de acordes com passagens autônomas, que não precisam necessariamente resolver, que fujam do II V I, essa questão mais livre, mais floatingdos caminhos harmônicos¨.
Ouça o trabalho de Fred Andrade em Spotify
EQUIPAMENTOS UTILIZADOS:
´Um Fuzz da Deep Trip chamado BOG, um TS10 da Ibanez, um reverb Holy Grail da Electro Harmonix e o amp Altovolts. A guitarra foi a Condor Signature Fred Andrade.
FICHA TÉCNICA:
Artistas: FRED ANDRADE e MEMBRANA
Álbum: ´Um dia´
Direção musical: Ricardo Vieira
Gravado, mixado e masterizado no Estúdio Carranca em Recife/PE
Gravação: Bruno Lins e Marco Melo
Mixagem e masterização: Júnior Evangelista
Capa: Gabi Etinger
Dudu Prudente: percussão
Pedrinho Mendonça: percussão
Júlio Rêgo: gaita
Ricardo Vieira: violão de 7 cordas
Fred Andrade: Guitarras
Nota: O álbum foi gravado em apenas 1 dia!